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Fazenda e base aliada fazem acordo para deter 'guerra' do ICMS


Por João Villaverde | De Brasília
O ICMS que incide sobre bens manufaturados importados comercializados entre Estados pode ter alíquota interestadual única de 4%, se confirmado o acordo fechado ontem pelo governo com os senadores da base aliada. Os Estados que hoje praticam políticas de estímulo às importações por meio do ICMS receberão, em troca, compensações do governo federal, como ampliação do limite de endividamento junto a instituições multilaterais de crédito para novos investimentos. Este foi o acordo fechado ontem entre os senadores da base aliada do governo Dilma Rousseff e o ministro da Fazenda, Guido Mantega.

Segundo apurou o Valor, o acordo entre o governo e os senadores agradou "enormemente" o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), que defende "uniformização do ICMS para importação", como a questão é tratada em Brasília. Sarney recebeu em seu gabinete, na semana passada, líderes industriais e sindicalistas para tratar da questão, formalizada na Resolução 72 do Senado Federal. Antes da reunião com Mantega, o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR) ouviu de Sarney que a questão "deve ter caráter de urgência urgentíssima".
Abordado logo após a reunião, na sede do Ministério da Fazenda, o ministro Guido Mantega confirmou a definição do acordo. "Está se constituindo um acordo para a Resolução 72 do Senado, e a tendência é que isso seja aprovado, logo após as audiências públicas que serão realizadas na semana que vem", disse Mantega, que confirmou a alíquota única de 4% do ICMS nas operações interestaduais com bens e mercadorias importadas.
Segundo o senador Eunício Oliveira (PMDB-CE), presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) no Senado, o governo se comprometeu a encontrar formas de compensação financeira aos Estados que perderem recursos com a adoção da alíquota única de 4% do ICMS sobre importações. "O governo vai fazer com que os Estados tenham uma compensação, mas ela será via investimentos. O ministro Mantega foi muito claro ao dizer que o interesse da presidente Dilma é que o setor público aumente muito os investimentos", afirmou Oliveira.
Há vinte dias, o Ministério da Fazenda ampliou em R$ 1,7 bilhão o limite de endividamento de dois Estados - Goiás e Santa Catarina - que estão entre citados ontem pelos senadores como os que devem receber compensações com a uniformização do ICMS para importados em 4%.
Jucá, Oliveira e Walter Pinheiro (PT-BA), líder do PT no Senado, reforçaram ontem que outro Estado, Espírito Santo, conta também com os investimentos da Petrobras para a construção de uma fábrica de fertilizantes. "Há uma série de caminhos para compensar a perda decorrente da mudança", disse Jucá. "O que não dá é para a situação continuar assim", afirmou Oliveira, "porque meu Estado [o Ceará] e todos os outros que não fazem esses incentivos de ICMS para importados vão fazer também, piorando ainda mais a guerra fiscal", disse.
O Senado vai realizar audiências públicas com os governadores do Espírito Santo, Santa Catarina e Goiás na próxima terça-feira, para discutir o acordo. Na quinta-feira, os senadores realizam nova audiência pública, desta vez com líderes das entidades patronais da indústria e dirigentes das centrais sindicais.

Senadores questionam se mudança é constitucional

Por Raquel Ulhôa | De Brasília
Sem apoio para adiar a votação e sem votos suficientes para evitar a aprovação, pelo Senado, da proposta de resolução que uniformiza as alíquotas do ICMS sobre operações interestaduais de produtos importados em 4% - uma das prioridades do governo na Casa-, senadores do Espírito Santo, de Santa Catarina e de Goiás, alguns dos Estados que serão prejudicados, agora questionam a constitucionalidade da medida.
Segundo Ricardo Ferraço (PMDB-ES), relator da proposta na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e representante do Estado que mais perde com o fim da política de incentivos fiscais à importação, afirmou que há dúvidas, por parte de juristas, sobre a possibilidade de uniformização do ICMS por resolução, em vez de lei complementar.
Pelo artigo 155 da Constituição, cabe ao Senado, por meio de resolução aprovada por maioria absoluta estabelecer alíquotas aplicáveis às operações interestaduais e de exportação. O problema, segundo Ferraço, é que a proposta em tramitação no Senado "não é fixação pura e simples de alíquota, mas está alterando o sistema de incentivos fiscais".
A votação da proposta de resolução número 72, de 2010, do líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR), deverá ser votada até o início de abril. Por proposta de Ferraço, apoiada por Luiz Henrique (PMDB-SC), ex-governador, Demóstenes Torres (DEM-GO), líder do seu partido, e Pedro Taques (PDT-MT), juristas serão convidados a participar de pelos menos uma das duas audiências públicas que a Comissão de Constituição e Justiça do Senado (CCJ) vai realizar nos dias 20 e 22 de março.
"Se vamos reconhecer, em uma comissão do Senado, que o que o ministro Guido Mantega [Fazenda] decidiu está decidido, vamos fechar o Congresso", disse Luiz Henrique, que considera fundamental ouvir juristas sobre a possibilidade ou não de a uniformização das alíquotas do ICMS ser feita por resolução do Senado - em vez de lei complementar- e se isso não afeta o princípio da anualidade.
Na primeira audiência prevista devem comparecer governadores de Estados, o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa e juristas. Da segunda, devem participar representantes do setor produtivo. Na semana passada, representantes de centrais sindicais e das entidades representativas da indústria se uniram para pedir ao presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), e aos líderes partidários urgência na votação dessa matéria.
Para a Confederação Nacional da Indústria (CNI), a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), centrais sindicais e outros participantes, a política de concessão de incentivos fiscais para a importação é uma das causas da crise pela qual atravessa a indústria. Há ações de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF) contra oito Estados que concedem esses benefícios, movidas pela CNI.

Alíquota única neutraliza disputa, diz indústria

Por Marta Watanabe | De São Paulo
As indústrias acreditam que a unificação de uma alíquota interestadual do ICMS em 4% para importados deve neutralizar a guerra fiscal dos portos.
José Ricardo Roriz Coelho, diretor do departamento de competitividade e tecnologia da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), diz que os 4% se aproximam do que algumas Fazendas estaduais que incentivam importação cobram de ICMS. "A definição em 4% não prejudica tanto esses Estados e faz diferença grande para o produto nacional que compete com o importado."
Nas transferências de importados que têm como destino São Paulo, por exemplo, a alíquota aplicável atualmente é 12%. Com o incentivo que resulta em cobrança efetiva de ICMS de 3% a 4% no porto de alguns Estados, o importado fica com vantagem de 8% a 9% em relação ao imposto pago pelo produto nacional que também vem de outro Estado para São Paulo.
"A alteração no ICMS não resolve tudo, mas já ameniza a competição com o importado", diz Heitor Klein, diretor da Associação Brasileira da Indústria de Calçados (Abicalçados). Marco Polo de Mello Lopes, que representa coalizão formada por vários segmentos industriais para acompanhar o assunto, diz que a unificação precisa ser votada rapidamente. Para ele, os incentivos de ICMS muitas vezes se contrapõem às medidas tributárias de defesa aplicadas pelo governo federal. A coalização, segundo Lopes, reúne os segmentos petroquímico, de aço, têxtil e de máquinas, entre outros.
Nem todos, porém, querem a mudança. Segundo Ivan Ramalho, presidente da Associação Brasileira de Comércio Exterior (Abece), as tradings estão acompanhando o assunto e tentam impedir a mudança. Para Ramalho, a medida deve acabar com incentivos fiscais que ajudaram a diversificar os pontos de desembarque de mercadorias, gerando empregos e maior dinâmica econômica em locais fora dos grandes mercados consumidores, como São Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo.
Ramalho diz que os grandes problemas de competitividade do produto brasileiro estão nos custos internos de produção e no câmbio. "O benefício fiscal não eleva as importações, apenas desloca o local de desembarque."
O tributarista Júlio de Oliveira, do Machado Associados, lembra que o Senado tem poderes para definir as alíquotas interestaduais do imposto e que a unificação a 4% pode neutralizar a maior parte dos incentivos. "Sem dúvida o quadro deve melhorar em relação ao que existe hoje", diz. Ele lembra, porém, que se a alíquota definida for efetivamente de 4%, ainda restará essa cobrança no Estado em que a mercadoria é importada, o que mantém a possibilidade de os Estados oferecerem novos incentivos para atrair desembarques. "Mesmo que o benefício seja menor, isso pode atrair importações, se for combinado com vantagens como boa infraestrutura portuária."

ES e SC querem regra de transição

Por Chico Santos | Do Rio
Os governadores dos Estados que adotaram alíquotas menores de ICMS nas operações interestaduais de produtos manufaturados importados não concordam com os termos do acordo anunciado ontem em Brasília. Espírito Santo e Santa Catarina reagiram à notícia. O governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB), disse ao Valor que se o governo aprovar simplesmente a unificação da alíquota interestadual do ICMS de importação em 4% para entrada em vigor de imediato "vai prejudicar, e muito" o seu Estado. "Se o governo tomar uma decisão de morte súbita, uma parte das empresa vai mudar direto para São Paulo. Vamos perder atividade econômica e receita", afirmou.
Procurado, o governo de Santa Catarina apenas soltou uma nota sobre o assunto. "O Estado de Santa Catarina defende uma saída gradual com redução de 1% ao ano e alíquota mínima de 6%. A redução para 4% traria muitas perdas, especialmente, porque o orçamento está em execução", diz o documento.
Casagrande defende que o governo crie uma regra de transição para o Espírito Santo com redução gradual da alíquota do ICMS ao longo de seis a sete anos e dê tempo para que os investimentos compensatórios na infraestrutura e economia local se concretizem e o Estado possa encontrar alternativas à situação atual. Desde 1971 o Espírito Santo tem em vigor o Fundo de Desenvolvimento das Atividades Portuárias (Fundap), na prática um programa que devolve ao importador cerca de 55% do ICMS recolhido nas compras externas. O programa nasceu para compensar perdas com a lavoura cafeeira.
Casagrande conta que inicialmente o programa abrangia exportações e importações. Em 1997, com a Lei Kandir, que isentou de impostos as exportações de produtos primários e semielaborados, o programa ficou restrito às importações. O Fundo repassa 25% do ICMS arrecadado nas importações aos 78 municípios capixabas, 20% ao Estado e devolve 55% às empresas por meio de um mecanismo de empréstimo a juros de 1% ao ano feito pelo Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo (Bandes).
Segundo Casagrande, o mecanismo gera tributos e atividade econômica, ao atrair para o Estado empresas importadoras. No ano passado, de acordo com o governador capixaba, foram arrecadados R$ 2,37 bilhões. Desse total, R$ 600 milhões foram para os municípios, R$ 425 milhões para o Estado e R$ 1,345 bilhão foram devolvidos às empresas.
O chefe do executivo do Espírito Santo queixa-se de que nos últimos anos o governo federal praticamente não investiu em infraestrutura no seu Estado, mantendo o mesmo porto de Vitória e o mesmo acanhado aeroporto, por exemplo, enquanto São Paulo e Rio de Janeiro recebiam recursos e construiam novas instalações.
Casagrande disse que antes mesmo da audiência pública do projeto de unificação do ICMS, marcada para o dia 20, ele estará em Brasília discutindo com autoridades federais e parlamentares alternativas para o problema. "Nós construímos nosso desenvolvimento com base nisso [no incentivo]", reclama.
O governador disse que já propôs a alternativa de retirar alguns produtos do programa, como os têxteis. Segundo ela, a retirada não iria reduzir as importações, evidenciando que o problema brasileiro é de câmbio e do chamado "custo Brasil".

Para Confaz, arrecadação pode crescer

Por De São Paulo
O coordenador dos Estados no Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), Cláudio Trinchão, diz que a unificação da alíquota interestadual é positiva e deve contribuir para gerar elevação da arrecadação consolidada.
"As alíquotas de ICMS variam de 17% a 25% conforme o Estado. Como alguns Estados cobravam apenas 3% ou 4% na importação de mercadorias, parte dessa arrecadação se perdia. Com a unificação do imposto interestadual esses incentivos são neutralizados." Trinchão, que é secretário de Fazenda do Maranhão, diz que a alteração do ICMS interestadual para importados é um passo para mudar o imposto em outras operações. (MW)

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