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Regulação do cooperativismo do trabalho


Por Mauro Scheer Luís
Com a publicação da Lei nº 12.690, em 20 de julho no Diário Oficial, foi definitivamente aprovado o projeto de lei que regula o cooperativismo de trabalho.
As cooperativas eram (e continuam sendo) reguladas pela Lei nº 5.764, de 1971. Certamente podemos afirmar que em 1971 o cooperativismo avançou muito com a aprovação da citada norma. Com o passar dos anos, entretanto, o cooperativismo, especialmente o de trabalho, vinha sofrendo pela falta de regulamentação especializada, uma vez que a Lei nº 5.764 é geral, aplicando-se a toda e qualquer cooperativa, como as de trabalho, de produção, de consumo, de saúde, de transporte, entre outras.

Na década de 90 e também no início dos anos 2000, em virtude de diversas crises econômicas que afetaram o nível de emprego, houve grande proliferação da quantidade de cooperativas de trabalho (que forneciam mão de obra mais barata), o que não se fez acompanhar, infelizmente, da manutenção da qualidade e do respeito aos direitos do trabalhador. Com efeito, passaram a ser cada vez mais comuns alegações de fraudes à CLT. Os tomadores de serviço também começaram a ser alvo de fiscalizações do Ministério do Trabalho, inquéritos e ações de iniciativa do Ministério Público do Trabalho e milhões de ações judiciais (reclamações trabalhistas) contra as cooperativas e seus tomadores, criando-se um cenário nebuloso de insegurança jurídica na contratação de trabalho cooperado.
Não basta ter legalidade é preciso que a cooperativa tenha legitimidade
Atualmente, os tomadores de serviço deixam de contratar cooperativas de trabalho não por seu custo, mas pelo receio que têm de assumir passivos trabalhistas e sofrer as mais diversas espécies de fiscalizações.
O parágrafo único do artigo 442 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) determinou que não haveria vínculo de emprego entre os cooperados, cooperativas e tomadores de serviço. Todavia, o texto legal era ignorado pelos juízes, fiscais e membros do Ministério Público, simplesmente porque trabalhadores eram "cooperativados" sem saber o que era uma cooperativa e sem ter participação na gestão dessas sociedades. O direito do trabalho pressupõe o "contrato-realidade", ou seja, pouco importa o que se encontra escrito nos documentos; mais vale o que realmente ocorre. E o que muitas vezes ocorria realmente era fraude.
O que a Lei nº 12.690 trouxe ao cooperativismo de trabalho brasileiro foi o alinhamento dos direitos e garantias fundamentais do cooperado. A lei foi projetada há anos dentro do seio do cooperativismo de trabalho, na Confederação das Cooperativas de Trabalho (Cootrabalho) - e nasceu do consenso de que as alegações de fraude contra o trabalhador só cessariam se cumpridas duas condições: a concessão ao cooperado dos direitos fundamentais previstos pela Constituição Federal ao trabalhador e que os cooperados deveriam pertencer a uma cooperativa apenas se conhecessem a fundo seus direitos e deveres. Em outras palavras: não basta ter legalidade; é necessário que a cooperativa tenha legitimidade.
Foi justamente o que fez a lei (que atendeu ao primeiro requisito), ao trazer a obrigação de concessão de certos direitos fundamentais, como limitação da jornada de trabalho, retiradas não inferiores ao piso da categoria, repouso semanal remunerado, retirada do trabalhador noturno superior ao diurno, adicional sobre atividades insalubres e perigosas, além do seguro de acidente de trabalho.
Acaba aqui a intensa fiscalização do Ministério Público sobre as cooperativas de trabalho? Certamente a resposta é não, pois não basta a concessão correta dos direitos previstos em lei. É necessário, ainda, cumprir o segundo requisito citado anteriormente, qual seja, a legitimidade da cooperativa.
Uma cooperativa é legal quando todos os seus documentos estão em ordem. Mas não é isso que a torna legítima. A legitimidade pode ser comprovada por vários indícios, dos quais podemos citar: deve haver rotatividade da diretoria, pois cooperativa não pode possuir um proprietário, ou ainda um pequeno grupo de proprietários; o cooperado precisa "ser" cooperado, e não "estar" cooperado. Isso significa que é fundamental que ele saiba como sua cooperativa é gerida. Precisa ainda participar ativamente das assembleias, manifestar suas opiniões e contribuir para o crescimento da sociedade - afinal de contas - ele é o verdadeiro "dono" da cooperativa.
As novas cooperativas (criadas após a publicação da lei) deverão seguir desde já as novas diretrizes legais. As cooperativas já existentes, entretanto, deverão adaptar-se no prazo de 12 meses.
Agora há a possibilidade real do cooperativismo de trabalho brasileiro seguir sua trilha de crescimento. Todavia, o sucesso dependerá da legitimidade. Quanto mais participação do trabalhador na gestão de sua cooperativa, mais legitimidade haverá, ampliando as chances de sucesso.
Mauro Scheer Luís é advogado sócio-fundador de Scheer & Advogados Associados e coordenador acadêmico de instituição de ensino executivo
Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações
 
Fonte: Valor Econômico
Fonte: Fenacon

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